18 de setembro de 2025

Sete livros e um filme para driblar a saudade de Luis Fernando Verissimo

Por Marcelo Dunlop

Luis Fernando Verissimo escreveu, em 1969, sobre o homem na lua e, em seu último texto, inédito e inacabado, tratou de Donald Trump. Suas crônicas, como se vê, cobriram a humanidade de alto a baixo.

Dono de espaço cativo em grandes jornais e revistas por 50 anos, o cronista implacável também se autoironizava. Dizia-se um palpiteiro profissional, cujo ofício era dar pitacos sobre tudo. Foi assim o pitaqueiro mais querido do país, ao manejar a palavra como um bisturi.

Chico Buarque dizia que abria na coluna de Verissimo para dar a primeira risada do dia. Luis Fernando, de fato, ensinou o Brasil a rir de si mesmo, enquanto mostrava a língua para o nosso ridículo. “Verissimo é um humorista singular, engraçado e sério ao mesmo tempo”, definiu o amigo Zuenir Ventura. “Ele nos faz pensar enquanto rimos, e nos faz rir enquanto pensamos.”

Singular e corajoso. Procure em nossa história outros grandes brasileiros que não intimidaram e terminaram tão ou mais gigantes que seus pais. São raríssimos. O Pedro Segundo, OK. O próprio Chico, filho de Sérgio Buarque. E as Fernandas, Torres e Montenegro. Nem no esporte a missão é simples. Pois Erico e Luis Fernando chegaram lá, no topo de qualquer estante que se preze, traduzidos para os principais idiomas. Juntos, pai e filho venderam mais de 13 milhões de livros.

Verissimo lançou mais de 88 títulos – um para cada ano de vida. Acabei por ler quase todos, por prazer de ofício, quando fizemos “Verissimas”, uma antologia de suas frases, pela editora Objetiva. Como os gênios são inesgotáveis, após o lançamento fui descobrir mais duas dele, estupendas. “O moralismo está a serviço de tudo, menos da moralidade”, esta lembrada por Patrícia Pillar (suspiros). A outra, anotada por André Dahmer: “Você veste o casaco quando sua mãe está com frio”. Ao menos aprendi: só faço livro agora com o Dahmer e a Patrícia Pillar.

Começar a gostar de Verissimo é simples, basta ir à livraria da esquina e levar um. Já para completar sua coleção, e driblar a saudade do mestre, recomendamos esta seleta de sete livros menos manjados e um documentário. Obrigado, Verissimo.

* “Sobre o tempo”, com Zuenir Ventura e Arthur Dapieve, editora Agir

“Estamos navegando águas profundas”, murmura Luis Fernando neste livro, a cada passagem delicada sobre a vida, a morte e o passado dos envolvidos. Em formato de um bate-papo saboroso, por vezes sério, por vezes hilário, esta joia literária revela episódios da juventude, da carreira e da visão política de Verissimo. “O único exercício que faço é soprar o saxofone”, brinca ele. O leitor vai descobrir, enfim, que Verissimo podia até elogiar os vitrais da catedral de Chartres, mas que nenhuma visão causou-lhe mais impacto do que os olhos verdes de Lúcia, naquele dia no Rio de Janeiro.

* “Borges e os orangotangos eternos”, editora Alfaguara

Numa eleição de melhores títulos da literatura nacional, este concorre nas cabeças, fácil.

É, além disso, considerado pelo próprio LFV como seu livro mais bem arquitetado, onde o narrador investiga um crime com a ajuda de Jorge Luis Borges. Diversos críticos consideram o seu “O jardim do diabo”, anterior, ainda melhor. Leia os dois e julgue você mesmo.

* “O cachorro bom de bola” (ilustrações de Catarina Bessell), ELO Editora

Crianças em casa? Leve esta divertida historinha infantil, e veja a molecada soltar as primeiras gargalhadas com Verissimo.

* “Comédias da vida pública – 266 crônicas datadas”, L&PM

“Todos os tempos são estranhos, os nossos são mais porque acontecem com a nossa presença”, diz o autor, na apresentação. Com textos de 1968 a 1995, esta antologia é mais do que um simples “livro de Verissimo”, mas um livro de História, capaz de fisgar estudantes e pesquisadores. Da passeata dos cem mil ao plano Real, temos o cronista no seu auge, a esmiuçar o século XX de modo sintético e afiado. Como ele lembra, censores e militares “avisaram ao jornal que ‘esse Luiz Carlos Verissimo está se excedendo’. Fiquei tranquilo, em caso de prisão levariam o meu primo.”

* “Ed Mort em Disneyworld Blues”, L&PM

Haveria uma raridade entre as milhões de edições de LFV espalhadas pelos sebos? Talvez a mais difícil de achar seja esta história em quadrinhos feita com Miguel Paiva, em que Ed Mort cruza com mais um corrupto magnata, numa trama pelo parque de Walt Disney. Alô, Miguel Paiva, sobrando eu compro!

* “Poesia numa hora dessas?!”, Objetiva

Luis Fernando foi pintor quando jovem, tornou-se músico e ganhou a vida como redator publicitário e depois escritor. O que falta? Acertou: poesia. Pois ele, completo, também se expressou em rimas, algumas delas reunidas neste pequeno livro, baita presente para jovens poetas.

* “Traçando Madrid”, editora Artes e Ofícios

Paris, Porto Alegre, NY, Japão e Roma. O cronista lançou, na série “Traçando”, seis livros que dão a sensação de que estamos viajando ao lado de Lúcia e Luis Fernando, parados diante dos mesmos quadros, correndo pelos museus, entrando nas mesmas sorveterias. Nesta viagem à Espanha, Verissimo faz uma opção pelas tintas ficcionais e escala, como guia turístico, o fantasma do pintor Goya. Ver Madrid pelos olhos de Verissimo e Goya, com Lúcia junto? Não fica melhor que isso.

* Documentário “O viajante”, de Silvio Barbizan

O cineasta niteroiense Angelo Defanti lançou em 2024 o melhor presente para os fãs de Luis Fernando, o documentário “Verissimo”, de 88 minutos. Como você já deve ter visto umas 17 vezes, na Globoplay, busque a pérola “O viajante” sobre Erico Verissimo, com cenas tocantes da família. Repare na caricatura fantástica de Erico sobre seu filhão. (Assista aqui o documentário: globoplay.globo.com/v/2849352)

*Marcelo Dunlop é jornalista e quer ser o Verissimo quando crescer.


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