Por Mateus Baldi
Na estreia da seção Com a palavra… convidamos o escritor, crítico literário e jornalista Mateus Baldi, que também integra o nosso grupo de autores brasileiros de ficção contemporânea. Mateus é um leitor atento e acompanha de perto os diversos caminhos da produção literária feita, hoje, no país. Portanto, com ele está a palavra:
Meu nome é Mateus Baldi, sou escritor e jornalista, e criei no Instagram o @resenhadebolso, voltada para a crítica de literatura contemporânea. Recentemente, organizei para a revista Época a terceira edição especial dedicada à literatura. Desde 2018, quando fizemos uma edição pioneira com ficções sobre a corrida eleitoral, esses especiais têm sido uma forma de aproximar a literatura brasileira contemporânea do público em geral. O objetivo é justamente achar o equilíbrio entre os nomes mais conhecidos e aqueles que não são tão lidos quanto deveriam. Sem contar a diversidade de origens e dicções, é claro – em um país como o Brasil, não dá mais para pensar a literatura com foco no eixo sudeste-sul.
O sucesso dessas edições atesta a ótima fase da literatura brasileira. Me impressionou muito como curador – e leitor – a variedade de vozes, o manejo da língua, as situações que inicialmente parecem ordinárias e se transformam em algo próximo ao sublime.
Gosto quando um conto ou livro transgride a fronteira dessas escalas. O melhor nacional que li em 2020, por exemplo, foi Solução de dois estados (Companhia das Letras), de Michel Laub, e opera nesse sentido: um exame potente da recentíssima crise sociopolítica que assola o Brasil. Aqui, estão em jogo o país e a intolerância que nos contamina, martelando a pergunta: até que ponto é possível aceitar a diferença antes que ela se torne irreconciliável?
Unindo essas duas pontas, Suíte Tóquio (todavia), de Giovana Madalosso, é um bom exemplo para demonstrar a força da literatura brasileira nos anos 2020. Quando a filha de um casal em crise é sequestrada pela babá, geral e particular se misturam diante da tensão irrevogável entre uma classe média moralmente falida e as múltiplas maternidades possíveis. Um ótimo romance pé na estrada e existencialista para pensar as relações – sociais, afetivas – em tempos tão fraturados.
De modo que os saudosistas podem se chatear à vontade. A literatura brasileira está vivíssima.
Foto: Mariana Vieira Elek